Olá
caros leitores, como prometemos aqui está a 2ª parte do texto:
CONTROLE
INTERNO E IMPARCIALIDADE: O PAPEL DA CORREGEDORIA NA PROTEÇÃO
INTEGRAL DO ADOLESCENTE
3. O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
O princípio da dignidade
da pessoa humana, no que se refere aos diretos individuais
consagrados pela Constituição de 1988, foi erigido como um dos
princípios fundamentais da nossa República. Desta forma, a
Constituição de 1988, em seu artigo 227, insculpiu a doutrina da
proteção integral como instrumento essencial para a promoção do
princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.
Ato contínuo, em 1990, o
Estatuto da Criança e do Adolescente (doravante ECA), em consonância
com os princípios antes referidos, instituiu uma nova política de
atendimento à criança e ao adolescente, sendo que tais políticas,
de uma forma geral, compreendem o conjunto de ações destinadas ao
amparo de crianças e de adolescentes que, face à condição
especial de vulnerabilidade social, são credores de estratégias de
atuação que extrapola as possibilidades de ação eficaz das
políticas básicas. (TAVARES, 2010: 330)
Tavares (op. cit.: 331)
ensina que essa nova política de atendimento à criança e ao
adolescente tem suas estratégias consubstanciadas em programas de
atendimento, as quais têm como público alvo:
- crianças e adolescentes em situação de risco que, em razão desta circunstância, são destinatários de programas de proteção;
- adolescentes envolvidos na prática de atos infracionais, incluídos em programas voltados a execução de medidas socioeducativas determinadas judicialmente, observadas as normas procedimentais apontadas nos arts. 171 a 190 do ECA.
O ECA estabelece já em
seu artigo 1º que seja destinada proteção integral à criança e
ao adolescente, destacando que a proteção à criança e ao
adolescente só pode ocorrer de maneira integral sob pena de ser
infrutífera. Messeder (2010: 09) assinala que, em contraponto com as
disposições contidas no antigo e revogado Código de Menores (Lei
nº 6.697/1979), a proteção integral encontra fundamento já no
art. 227 da Constituição Federal de 1988 que subleva as crianças e
adolescentes à mera condição de bem/objeto.
Assim sendo, é dever da
Administração Pública zelar, de forma ainda mais contundente, pelo
efetivo cumprimento do princípio da proteção integral àqueles
adolescentes que se encontram sob sua tutela; vale dizer: a
Administração Pública deverá garantir proteção integral a
qualquer adolescente, em especial àqueles que se encontram sob a
tutela do estado.
De acordo com a nova
política de atendimento aos adolescentes em conflito com a lei e que
se encontram sob a tutela da Administração Pública, as medidas
socioeducativas – como o próprio nome sugere – constituem
alternativas no caminho da responsabilização e da ressocialização
de tais adolescentes (cf. TAVARES, 2010: 346).
Ao conjugarmos a
necessidade de um modelo de gestão pública que melhor atenda as
políticas sociais – inclusive as de atendimento à criança e ao
adolescente – introduzidas pela Constituição de 1988, o NOVO
DEGASE tem como missão “promover socioeducação no Estado do Rio
de Janeiro, favorecendo a formação de pessoas autônomas, cidadãos
solidários e profissionais competentes, possibilitando a construção
de projetos de vida e a convivência familiar e comunitária” 1.
Outrossim, à luz da
legislação e doutrina pátria, a Lei Estadual nº 5.933, de 29 de
março de 2011, “que dispõe sobre a reestruturação do quadro de
pessoal do Departamento Geral de Ações Socioeducativas – DEGASE”,
estabelece serem atribuições do Agente Socioeducador:
1
– 7. omissis
8. Desenvolver tarefas,
junto com as equipes técnicas que preservem a integridade física e
psicológica dos adolescentes e dos funcionários no exercício das
atividades internas e externas;
9 – 23. omissis
24. Zelar pelo
companheiro de equipe, interagindo com fins de evitar qualquer
violência ou agressão.
Assim, intolerável se
torna qualquer ação que atente contra a integridade física e/ou
psicológica dos adolescentes. Caso um servidor que integre o quadro
de um órgão voltado à socioeducação cometa algum ato desta
natureza, este servidor estará não só praticando conduta
tipificada na legislação penal, mas também contrária às
atribuições inerentes ao cargo que ocupa e às normas
regulamentares previstas no Estatuto dos servidores públicos
referente ao quadro funcional a que pertence.
4. O PAPEL DA CORREGEDORIA: DUPLA FEIÇÃO DO PODER DISCIPLINAR EM PROL DA PROTEÇÃO INTEGRAL DOS ADOLESCENTES
Não há como a
Administração Pública fazer valer suas obrigações e seu objetivo
máximo sem que sejam observados os princípios constitucionalmente
consagrados da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade,
eficiência (art. 37, CRFB/1988).
Neste sentido, entende-se
imprescindível um modelo de gestão administrativa por meio do qual
seja exercido um controle interno eficiente sob os agentes que se
encontrem dentro da esfera de poder de um determinado órgão
público. O referido controle decorre da prerrogativa de autotutela
que é conferida à Administração Pública, razão pela qual cabe a
ela mesma invalidar ou revogar condutas ilegais ou inconvenientes
praticadas por seus membros2
(CARVALHO, 2011:
1028).
Assim, a Corregedoria
aparece como um dos instrumentos que promovem o controle interno no
âmbito do DEGASE. O Decreto Estadual nº 32.137, de 06 de novembro
de 2002, que “cria a Corregedoria interna do Departamento Geral de
Ações Socioeducativas – DEGASE”, dispõe in verbis:
Art.
2º - A Corregedoria Interna ora criada integrará a
estrutura básica do Departamento Geral de Ações Sócio-Educativas
- DEGASE, tendo as seguintes atribuições:
I - assessorar o Diretor
do DEGASE, em matéria inerentes à Justiça e Disciplina;
II - instaurar
procedimentos para apurar infrações disciplinares imputadas a seus
servidores, aplicando, no que for de sua competência, as
respectivas penalidades, ou, conforme o caso, remetendo à autoridade
competente para a aplicação;
III - proceder a
inspeções no âmbito do DEGASE, visando à regularidade do serviço;
e
IV - promover as
atividades de correição dos integrantes do DEGASE. (grifo
nosso)
Desta forma, conforme já
explicitado anteriormente, os princípios da dignidade da pessoa
humana e da proteção integral do adolescente são os princípios
norteadores do modelo de gestão a ser adotado pelos órgãos e
entidades públicas responsáveis pelo atendimento a adolescentes que
cumprem alguma medida socioeducativa.
A Corregedoria do DEGASE
(doravante CODEG) adota uma linha programática norteada pelos
princípios antes referidos e não se limita ao campo da mera
repressão a desvios de conduta por parte de servidores. A CODEG atua
também de forma preventiva, isto é, procurando evitar práticas que
tenham o potencial de gerar danos às políticas públicas de
atendimento a adolescentes infratores. A linha programática adotada
está voltada para metas de gestão, produção, simplificação de
procedimentos, e não mais para a burocracia do Direito (prazos
dilatados, formalismo excessivo, produção de documentos
desnecessários à elucidação dos fatos a serem apurados, entre
outros).
Assim sendo, não só de
acordo com o Decreto que a criou como também em consonância com o
ordenamento jurídico vigente, a Corregedoria do DEGASE atua em
detrimento do formalismo exagerado, fazendo prevalecer a busca pela
verdade real. Outrossim, a CODEG opera fortemente na prevenção a
qualquer ato que possa configurar-se lesivo à proteção integral do
adolescente. A atuação da Corregedoria neste sentido dá-se por
meio de ações de caráter didático, inspeções periódicas,
correições e monitoramentos. Tem-se, portanto, que o papel da
Corregedoria é o de orientar e instruir, sem, no entanto, esquecer
de seu caráter fiscalizador.
A imparcialidade é
exigida dos agentes públicos na gestão da res publica, na
tomada de decisões ou no momento em que um ato for praticado. Isto
posto, os agentes públicos “devem se manter equidistantes dos
interessados e, sua atividade, tal qual a de um juiz, é subordinada
exclusivamente à lei, a cujo império se submete como penhor de
imparcialidade na condução do encargo que lhes compete” (MARTINS,
2009).
Neste diapasão, esta
imparcialidade tem por fulcro o interesse coletivo, o qual só pode
ser atendido mediante a aplicação de um modelo de Administração
Pública orientada para resultados. Faz-se necessária, portanto, a
implantação de uma gestão dinâmica capaz de obedecer a um
conjunto de orientações estratégicas, bem como aos princípios
norteadores de uma política eficaz de atendimento aos adolescentes e
que esteja de acordo com ordem jurídica vigente.
No atual cenário por
qual passam as instituições públicas em nosso país, surge com
grande força uma questão: como exercer, de forma imparcial e
eficaz, o controle interno dos agentes públicos? Em outras palavras:
como um órgão ou agente público destacado para o exercício do
controle interno deve agir para se manter imparcial no julgamento de
seus pares? E mais: seria eficaz – senão adequado – o controle
da função pública exercido por agentes públicos sobre outros
agentes públicos do mesmo órgão?
Decerto que a
imparcialidade desejada está intimamente ligada à questão
anteriormente suscitada acerca do controle interno. O controle
interno – ou controle administrativo – consiste na fiscalização
que a Administração Pública exerce sobre suas próprias
atividades. A finalidade deste controle é manter as atividades
públicas em consonância com o ordenamento jurídico vigente e de
acordo com as necessidades do serviço, bem como de acordo com os
parâmetros técnicos e econômicos exigidos para uma determinada
atividade. Assim, por meio deste controle, a Administração Pública
pode anular, revogar ou alterar seus próprios atos, além de punir
os agentes que, porventura, descumpram seus deveres e/ou obrigações.
O controle interno tem
por objetivo, então, a desburocratização do serviço público e,
por consequência, tornar os órgãos e entes públicos mais
eficientes no cumprimento de suas funções. Uma gestão pública
eficaz pressupõe, portanto, capacidade autogestão da Administração
Pública; a autogestão dos órgãos públicos, por conseguinte,
somente é alcançada por meio da autonomia da Administração
Pública; autogestão e autonomia, por fim, implicam – e replicam –
em um melhor gerenciamento da res publica.
Há que se entender
forçosamente que autogestão, autonomia e eficácia constituem os
pilares de um serviço público ágil, moderno e voltado para os
interesses coletivos. Ato contínuo, o controle exercido por
servidores do próprio órgão fiscalizado tende a ser não só mais
eficiente como mais econômico. Os servidores que integram o órgão
público fiscalizado possuem maior expertise para lidarem com as
questões atinentes ao serviço público prestado, o que, por seu
turno, acaba conduzindo à desburocratização dos procedimentos
(fiscalizações, correições, processos disciplinares, entre
outros), à maior celeridade na solução de problemas, além da
adoção de medidas preventivas mais eficazes.
Dessa forma, sendo o
controle interno mais econômico e célere no que diz respeito à
prestação de serviços públicos, a imparcialidade daqueles que
atuam neste controle é fundamental. Retoma-se, então, uma das
perguntas anteriormente sugeridas: como um órgão ou agente público
destacado para o exercício do controle interno deve agir para se
manter imparcial no julgamento de seus pares?
A imparcialidade por
parte daqueles que atuam no controle interno advém da necessidade de
se perseguir a verdade real e, consequentemente, promover a justiça.
Assim, sem que seja observada a imparcialidade, corre-se o risco de o
controle interno “transformar-se em um instrumento de iniquidades,
com distribuição de favores aos amigos ou poderosos e a imposição
de danos e prejuízos aos inimigos ou desvalidos” (MARTINS, 2004).
Nestes termos, a imparcialidade só há de ser alcançada mediante a
fixação de preceitos objetivos a serem seguidos, afastando-se, ao
máximo, a subjetividade quando da análise dos fatos em apuração.
Em processos
administrativos disciplinares instaurados no âmbito do DEGASE e
processados pela CODEG, busca-se, incessantemente, a imparcialidade
necessária ao bom julgamento de supostas irregularidades. Dessa
forma, durante a instrução dos processos, os servidores destacados
para a apuração de possíveis desvios funcionais lançam mão de
todos os instrumentos probatórios capazes de comprovar – ou não –
a materialidade e autoria dos fatos em análise, quais sejam:
resultado de exame de corpo de delito e outros exames periciais
aplicados ao caso concreto, documentos, imagens (fotos e/ou vídeos),
entre outros.
Evita-se, assim, a
instrução e julgamento dos procedimentos baseados apenas em
declarações dos servidores e/ou adolescentes envolvidos. Isto não
significa dizer, no entanto, que tais declarações careçam de
credibilidade e, por isso, mereçam ser descartadas; ou seja: essas
declarações devem fazer parte – e não “estar acima de” –
do conjunto suficiente de provas ao esclarecimento dos fatos trazidos
à baila pela instauração de procedimento administrativo
disciplinar. O que efetivamente se pretende é afastar a
subjetividade na apreciação das provas. Frise-se, por oportuno, que
a subjetividade aqui tratada refere-se àquela que pode pesar, por
motivos pessoais, em favor de uma parte e/ou em detrimento de outra.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme dito no início
do presente trabalho, o objetivo maior deste era explicitar não só
os conceitos mais modernos acerca da gestão pública e controle
interno, mas também refletir acerca dos alicerces sobre os quais se
pauta a Corregedoria do NOVO DEGASE. O que se pretendia
fundamentalmente era buscar formas e/ou instrumentos capazes de
conduzir o processamento e julgamento de processos administrativos
disciplinares com maior imparcialidade e transparência possíveis.
Desta feita, foram analisados tanto os processos administrativos
disciplinares sob a ótica da doutrina mais moderna, além dos
princípios legais norteadores da política de atendimento aos
adolescentes infratores. Ao conjugarmos os elementos antes descritos,
foi possível realizar uma análise sobre a atuação da CODEG do
NOVO DEGASE e, consequentemente, buscar novas formas para se alcançar
a excelência na prestação do serviço público a que se destina.
REFERÊNCIAS
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Ministério Público: contributo à compreensão crítica de seus
institutos e conceitos”. In Revista do Ministério Público do
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, n.53, p.89-106.
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Antônio Carlos Alencar. (2011) Manual de Processo Administrativo
Disciplinar e Sindicância: à luz da jurisprudência dos Tribunais e
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ampl. Belo Horizonte: Fórum.
CARVALHO
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23ª ed. rev, ampl. e atualizada. Rio de Janeiro: Lumen Juris.
MARTINS,
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http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1525/Do-julgamento-doprocesso-
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Acessado em 18 de outubro de 2011.
MESSEDER,
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adolescente: atualizado pela Lei nº 12.010/2009. Rio de Janeiro:
Elsevier.
TAVARES,
Patrícia Silva. (2010) “A Política de Atendimento”. In MACIEL,
Kátia Regina F. L. Andrade (coord) Curso de Direito da Criança e
do Adolescente. 4ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Lumen Júris.
Agradeço
a preciosa colaboração, do Sr. Alexandre de Moraes Lessa,
Corregedor do NOVO DEGASE e do Sr. Marcelo Alexandre Silva Lopes de
Melo, Agente Socioeducador que abrilhantaram o Bula Jurídica e peço
que continuem nos ajudando.
Caros Leitores caso queiram entrar em
contato com os autores é só acessar um dos endereços eletrônicos
abaixo: alessandrelessa@degase.rj.gov.br
ou
corregedoria@degase.rj.gov.br
Beijos
para todos,
Fernanda
C. e Fernanda F.
2
As
Súmulas nº 346 e 473 do STF deixaram não só assentada a
possibilidade de Administração revogar ou invalidar seus atos,
como também identificadas as formas de desfazimento..